quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Foi por aí que eu perdi...



Pelotas, 1º de julho de 2010

Perda da avó

Ajoelhada, com as mãos sobre as coxas, Gessi narra:“Minha avó era cozinheira, ela cozinhava para estudantes. Hoje todos são engenheiros. Lembro que ela tinha uma cama imensa, em que todos nós cabíamos nela. Fiquei pensando no que eu perdi, e que eu gostaria de encontrar de novo: a minha avó.”
A coreógrafa-diretora Maria, provoca: “Gessi, imagina que estás contando essa história para alguém, lembra da tua avó e entra nessa cama imensa.
Aos poucos as atrizes bailarinas: Taís, Alexandra, Ionara e Tuani vão se aproximando de Gessi, e deitando ao seu redor como se estivessem no aconchego da cama imensa da avó. Gessi faz gestos de acolhimento, toca em cada uma delas. A cena acontece como se a cama não tivesse limites para o afeto daquela vó.

Perda da liberdade sobre o lombo do cavalo

Já cantava o músico e compositor Pelotense, Vitor Ramil: “como é linda a liberdade sobre o lombo do cavalo...” (música: Deixando o Pago). É esse o espírito da cena desencadeada por Roberta. A perda da liberdade, do sair por aí nos campos com seu cavalo.

A liberdade perdida... e na sua fala, breves pausas pela perda das palavras quando quer expressar aquilo que sentia quando corria pelos campos imensos sem preocupação nenhuma. Como se as palavras não tivessem esse alcance da experiência, das sensações lembradas. As palavras lhes escapam... Nessa cena, as atrizes-bailarinas Elen, Tauana, e Denise entram fazendo sons de percussão corporal simulando o trotear dos cavalos, na seqüência surgem movimentos de “peito aberto”, movimentos amplos, movimentos de liberdade. Ao fundo o ator-bailarino Vagner, se põe com movimentos que fluem como se estivesse cavalgando, e nas mãos cordas num emaranhado que se transformam em ações de um laçador.


Os atores-bailarinos das diferentes cenas se misturam com as trajetórias que começam a serem traçadas no espaço. Do lugar onde estavam, saem em diferentes tempos e percorrem a sala. Nesse momento, Maria, coloca: “é importante o impulso na hora da saída. A saída tem que ser expressiva. Ela tem que expressar liberdade, e deve partir de um impulso.”



Fragmento literário: Negrinho do Pastoreio (João Simões Lopes Neto)

“O Negrinho anda sempre à procura dos objetos perdidos, pondo-os de jeito a serem achados pelos seus donos, quando estes acendem um coto de vela, cuja luz ele leva para o altar da Virgem Senhora Nossa, madrinha dos que não a têm. Quem perder suas prendas no campo, guarde esperança: junto de algum moirão ou sob os ramos das árvores, acenda uma vela para o Negrinho do pastoreio e vá lhe dizendo —Foi por aí que eu perdi... Foi por aí que eu perdi... Foi por ai que eu perdi! Se ele não achar… ninguém mais.”

Texto-fonte: Contos gauchescos e Lendas do Sul.
3ª ed. Porto Alegre: Globo, 1965.
Editoração eletrônica de Luiz Abel Silva


Catia Fernandes de Carvalho
Coreógrafa- UFPel
Colaboradora do Núcleo de Dança-Teatro Tatá

Nenhum comentário:

Postar um comentário