terça-feira, 28 de junho de 2011

A lenda boitatá... a escuridão... os nossos medos...






Questões provocadoras das ações corporais:

• Quais são os nossos medos?

• Quem é a nossa “boi tatá” hoje?

• O que é que come os nossos olhos e nos tira a luz?

Cada ator-bailarino foi provocado a lembrar de algum momento em que sentiu muito medo. Todos fecharam os olhos e deveriam mostrar como era esse medo nos seus corpos. As sensações corporais começam a tomar forma em cada movimento e não-movimento: pavor, procura por um abrigo e proteção, busca, dor, desespero, intensidade, tensão, contração abdominal, contração nas costas, contração das mãos e punhos, corpos trêmulos, corpos curvados, corpos assustados, todos afetados por algo forte que tomava conta e por vezes paralisava- era o medo vivido nos corpos, pelos corpos.

Maria, a coreógrafa, pede então que abram os olhos. E coloca: Como é esse novo olhar depois do medo que experimentaram há pouco? Percebam como estão os corpos de vocês. Quando a luz volta se deixem acolher e acolham. E agora? Como é esse novo olhar quando retorna a luz? Pensem como se cada um de vocês fosse agora um téu-téu que pudesse iluminar. O téu-téu é aquele que vê no escuro, ele vê muito além, ele é aquele que cuida do ninho de longe.

Ensaio de 01.06
por Catia Fernandes de Carvalho




Fragmento da Lenda de Simões Lopes Neto:

M'boitatá


Foi assim: num tempo muito antigo, muito, houve uma noite tão comprida que pareceu que nunca mais haveria luz do dia. Noite escura como breu, sem lume no céu, sem vento, sem serenada e sem rumores, sem cheiro dos pastos maduros nem das flores da mataria.

Os homens viveram abichornados, na tristeza dura; e porque churrasco não havia, não mais sopravam labaredas nos fogões e passavam comendo canjica insossa; os borralhos estavam se apagando e era preciso poupar os tições... Os olhos andavam tão enfarados da noite, que ficavam parados, horas e horas, olhando semver as brasas somente, porque as faíscas, que alegram, não saltavam, por falta do sopro forte de bocas contentes.

Naquela escuridão fechada nenhum tapejara seria capaz de cruzar pelos trilhos do campo, nenhum flete crioulo teria faro nem ouvido nem vista para abter na querência; até nem sorro daria no seu próprio rastro!

E a noite velha ia andando... ia andando...

Minto:

No meio do escuro e do silêncio morto, de vez em quando, ora duma banda ora doutra, de vez em quando uma cantiga forte, de bicho vivente, furava o ar: era o téu-téu ativo, que não dormia desde o entrar do último sol eque vigiava sempre, esperando a volta do sol novo, que devia vir e que tardava tanto já...

Só o téu-téu de vez em quando cantava; o seu - quero-quero! - tão claro, vindo de lá do fundo da escuridão, ia se aguentando a esperança dos homens, amontoados no redor avermelhado das brasas. Fora disto, tudo omais era silêncio; e de movimento, então, nem nada.

FONTE: Livro "Lendas do Sul" de J. Simões Lopes Neto. Editora Globo. 11a edição. 1983. disponível em: http://www.paginadogaucho.com.br/lend/mboi.htm






quinta-feira, 9 de junho de 2011

Ensaio sobre o conto BATENDO ORELHA!...

  Trabalhando um dos contos Gauchescos de J Simões Lopes Neto, sobre o homem e seu cavalo, mais precisamente sobre a doma deste cavalo, foi nos colocada a seguinte proposta pela coreógrafa:
           - Pensem em algum momento de suas vidas em que algo ou alguém tentou domá-los.
            A princípio parece sem propósito, embora esse trabalho seja norteado desta forma  (pesquiza em cima do corpo=vida do bailarino)          algumas falas tiradas dos textos e adaptadas, outras criadas a partir das histórias vividas pelo bailarino e o movimento vem a partir do que aquele assunto provoca no  corpo de cada um.
            Mesmo estando acostumada com este modo de compor, algumas questões ainda me pegam de surpresa.
            Em que momento da vida me senti sendo domada. São tantas as situações que isso acontece que é díficil pensar em uma apenas.
            Tínhamos que mostrar no corpo do colega o que pensamos.  O material que havia em cena naquele momento para traduzirr a idéia pensada em ação para que os outros pudessem ver eram algumas cordas, saias, tecidos...
            Então eu comecei a contar a minha história de alguns minutos, ou segundos talvez... e a chorar...
            Não consegui contar exatamente o que acontecia na escola, porque não era isso que realmente importava, mas como eu me sentia,
então peguei uma saia grande cheia de babados e cobri o corpo do colega que estava sentado, deixando só o rosto de fora, na verdade queria que aparecesse apenas os olhos e o nariz. O resto tudo deveria estar escondido. Essa saia me podou muitas possibilidades.
             Afinal de contas o que uma criança pobre e negra  ( moreninha ) tem para ser aproveitada na escola.
             Já se passaram muitos anos.
           A saia que eu coloquei cobrindo o corpo do colega continua aí pelas escolas da vida, limitando e domando muitas oportunidades...

Gessi